É sábado à noite e a
estudante A., de 23 anos, se arruma para sair. Junto com a carteira, o celular
e as chaves de casa, coloca na bolsa um frasco pequenino. Dentro dele, cristais
de MDMA (abreviação de metilenodioximetanfetamina) dissolvidos em quatro dedos
d’água. Já na festa, com a ajuda de um conta-gotas, pinga generosas doses do
líquido no drinque que comprou e bebe.
Após a ingestão, A. descreve um cardápio de sensações que costuma
sentir: as cores saltam aos olhos, a música ganha uma melodia diferente e um
simples toque de braços traz um prazer à flor da pele junto com a promessa de
uma noite sem fim.
À primeira vista (gole?) inebriante, o MD — ou “Michael Douglas”, como
também é chamado pelos jovens — pode provocar consequências nada glamourosas.
Depressão, diminuição da produtividade e dependência química e psicológica são
alguns dos efeitos colaterais. Cada vez mais popular no Brasil, os cristais
amarronzados estão tão presentes na noite carioca hoje quanto a cocaína nos
anos 1980 e 1990, desbancando outras substâncias químicas ilícitas populares
entre os jovens até então, como o ecstasy e o ácido.
— O MD é o princípio ativo do ecstasy. Podemos dizer que é uma cocaína
mais fraca e também tem efeito mais brando que o LSD. Claro, tudo dependendo da
quantidade ingerida — explica a chefe do Setor de Dependência Química e Outros
Transtornos do Impulso, da Santa Casa da Misericórdia do Rio, Analice
Gigliotti. — É um estimulante e mexe com o sistema nervoso central, causando
alterações na percepção das cores, da luminosidade e dos sons.
Os números traduzem o aumento do consumo da droga. Segundo o Instituto
de Segurança Pública (ISP), os últimos dados computados e divulgados pelo
Instituto de Criminalística Carlos Éboli apontam um aumento de 347,3% na
apreensão de MD de 2010 para 2011. Ou seja: se em 2010 a quantidade de MD
apreendida foi de 123,9 gramas, em 2011 o número subiu para 554,2 gramas.
Segundo o ISP, os dados de 2012 ainda não estão disponíveis. Apesar da maconha
ainda continuar sendo a droga mais consumida, o MD é a mais usada entre as
substâncias sintéticas, deixando o LSD em segundo lugar.
Criado em laboratório, o MDMA é considerado por especialistas uma droga
recente, com estudos ainda prematuros a respeito. De acordo com o artigo “An
exploration for the history and controversies surrounding MDMA and MDA”, de
Alana R. Pentney, publicado no site da organização americana Maps
(Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies), o primeiro registro de
preparação da substância data de 1912, na Alemanha. Após ser usada
experimentalmente com fins terapêuticos, a droga acabou sendo considerada
ilegal em 1980.
— O estudo do MD é embrionário no mundo inteiro, mas no Brasil ele ainda
é inexistente — diz o psicoterapeuta curitibano Daniel Rezinovsky, professor do
curso Enteógenos e Estados Alterados da Consciência, ministrado no último fim
de semana na Comuna, em Botafogo, em que o MDMA foi um dos tópicos. — O
interessante dessa substância é que ela vem se provando promissora em
tratamentos pós-traumáticos em veteranos de guerra, em experimentos nos Estados
Unidos, por exemplo. Mas é muito importante diferenciar o ambiente clínico, em
que tudo é calculado, do ambiente das baladas, em que a droga é ingerida sem
controle algum, muitas vezes misturada com outras substâncias.
A cerca de R$ 150 a grama (quantidade geralmente consumida por duas ou
três pessoas numa noite), o MD é mais consumida em festas de classe média alta.
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